CENTRO DE REABILITAÇÃO ORIENTAÇÃO E ASSISTENCIA AO ENCEFALOPATA – CORAE
CER II – REABILITAÇÃO FÍSICA
TURNO: VESPERTINO
CRISTIANE DOS SANTOS MELO NUNES
DAMARIS CRISTINA DOS SANTOS
FLAVIA CRISTINA QUIRINO DE MELO
PATRICIA APARECIDA DE PAULA CARVALHAIS RIBEIRO
SÍNDROME DE GUILLAIN – BARRÉ: UM ESTUDO DE CASO
Estudo de caso apresentado ao CORAE, objetivando teorizar a discussão multidisciplinar de uma patologia apresentada por usuário atendido pela equipe de reabilitação física do turno vespertino, nesta instituição.
GOIÂNIA
2018
1. INTRODUÇÃO
A Síndrome de Guillain-Barré pode ser classificada com uma polineuropatia aguda, desmielinizante e inflamatória de caráter auto imunológico. Caracteriza-se por uma desmielinização dos nervos motores principalmente, mas pode também atingir os nervos sensitivos, ocorrendo um comprometimento periférico ascendente, progressivo e simétrico (MORAES et al., 2015).
A SGB causa inflamação e alterações degenerativas nas raízes nervosas posteriores (sensoriais) e anteriores (motoras). Por isso é que os sinais de perdas sensoriais e motoras ocorrem de modo simultâneo. Além disso, a transmissão nervosa autônoma pode ser prejudicada (CARVALHO & LOPES 2013).
Sua causa exata ainda se encontra desconhecida, no entanto alguns estudos demonstram a correlação com infecções e reações vacinais. Segundo alguns autores as infecções do trato respiratório superior e infecções gastrointestinais como diarreia associada à bactéria Campylobacterjejuni, são as maiores causas relacionadas com a doença. Nesses casos, a SGB normalmente ocorre 01 a 03 semanas após o evento infeccioso. Ainda infecções virais como citomegalovírus, vírus do Herpes, da hepatite A e B e vírus da AIDS estão associadas em menor proporção. (MORAES et al., 2015).
A Síndrome de Guillain-Barré (SGB) consiste em um dos mais frequentes subtipos de polineuropatia periférica aguda. Afeta anualmente 02 pessoas a cada 100.000 de forma aleatória. Há indícios de maior ocorrência da doença entre a população masculina e pessoas entre 50 a 74 anos, porém ela pode atingir indivíduos de todas as faixas etárias, ambos sexos ou raça. Entre 04 a 15% dos pacientes com SGB morrem durante o tratamento e cerca de 20% ficarão com alguma deficiência (TUACEK et al., 2012).
2. SINTOMAS
Sua manifestação clinica caracteriza-se pela dor e perda de força muscular progressiva dos membros inferiores, evoluindo para a diminuição ascendente dos movimentos. Podem ocorrer sintomas sensitivos como o formigamento e sensação de queimação nos membros inferiores e superiores de forma distal. Ainda a doença pode evoluir para paralisia flácida, afetando músculos da face, orofaringe, respiração de deglutição (MORAES et al., 2015).
Outras complicações associadas à fase aguda da doença de Guillain-Barré são insônia, formação de úlceras de pressão, dificuldade de comunicação, deficiência nutricional, imobilismo e trombose venosa (TUACEK et al., 2012).
O diagnóstico ocorre primeiramente de forma clínica, na qual o paciente apresenta dificuldade para deambulação, sensação de dormência ou fraqueza na musculatura, sensação de perda de força na musculatura esquelética, em alguns casos intensa dor em toda a extremidade corpórea. Posteriormente, para a confirmação do quadro clínico deve-se realizar o diagnóstico laboratorial, que pode ser através da análise do líquido cefalorraquidiano ou através do diagnóstico eletrofisiológico, também conhecido como eletroneuromiografia (MORAES et al., 2015).
3. TRATAMENTO
Estudos indicam que deve ocorrer por meio da imunoglobulina intravenosa (IgIV) em altas doses ou a plasmaférese, pois possuem igualmente resultados satisfatórios. Já para o Ministério da Saúde o tratamento da Síndrome de Guillain-Barré pode ocorrer com corticosteroide, imunoglobulina humana e plasmaférese. Para o uso de imunoglobulina humana faz-se necessário um esquema que seja de 0,4 g/Kg/dia por via intravenosa, por um período de cinco dias, para o uso da plasmaférese faz-se importante o uso de 200-250 ml/kg a cada 48 horas variando conforme o grau da doença. (MORAES et al., 2015).
Estudos afirmam que o tratamento de SGB deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar, propiciando a prevenção das complicações e manejo dos sintomas durante a fase aguda da doença. O tratamento de reabilitação física é necessário em 40% dos casos de SGB, a ação da equipe interdisciplinar é essencial para minimizar as sequelas e promover a independência e autonomia dos pacientes (TUACEK et al., 2012).
De acordo com O’Sullivanet al (2004), é necessário o retorno do indivíduo acometido pela SGB a um estilo de vida o mais próximo ao que era antes da doença. Nessa perspectiva, a realização de tratamento fisioterapêutico tem como objetivo uma melhora das condições físico-funcionais e treino das atividades de vida diária. Portanto é essencial a criação de estratégias de intervenção que visem à reabilitação desses portadores. Além disso, o apoio familiar e um bom alicerce psicológico são fundamentais para que se obtenha resultados positivos (CARVALHO & LOPES, 2013).
4. RELATO DE CASO
Otaíres Luz e Silva, 43 anos, casada, mãe de um filho, comerciante, residente em Goiânia. Relatou ter tido uma infecção intestinal em fevereiro de 2017, o que acontecia recorrentemente, se automedicou em casa, mas percebeu que desta vez os sintomas estavam diferentes. Procurou atendimento médico com a queixa de fraqueza nos membros inferiores, dores e febre, foi medicada e liberada. Com o passar dos dias os sintomas agravaram, parou de andar, não segurava mais objetos, falava e respirava com dificuldades, fazendo com que a paciente retornasse ao mesmo plantão médico onde recebeu o diagnóstico da Síndrome de Guillain – Barré ficando internada por dois meses e dez dias na UTI. Foi entubada, traqueostomizada e usou sonda nasogástrica. Recebeu o tratamento de Plasmaferese e Imunoglobulina Intravenosa. Durante o período de internação, Otaíres permaneceu todo tempo consciente. Ao receber alta hospitalar, foi para casa assistida por uma equipe de Home Care.
Admitida nesta instituição em 23/08/2017 com o diagnóstico de Síndrome de Guillain – Barre. Na avaliação médica inicial no CER II, mostrou uma debilitação severa: fraqueza muscular dos membros superiores e inferiores; sem marcha, sendo locomovida por cadeira de rodas; diminuição da ADM (Amplitude de Movimento) para os quatros membros; falta de coordenação motora; sem preensão palmar; pé equino; dificuldade para AVD´S (Atividades de vida diárias) e bastante cansativa ao exame e negou hipertensão e Diabetes. Iniciou tratamento com a equipe multidisciplinar no dia 30/08/2017.
4.1. FONOAUDIOLOGIA
Síndrome de Guillain-Barré (SGB) pode atingir nervos cranianos; caracterizada pela ocorrência de ataque auto-imune agudo, com debilidade simétrica progressiva, variável e ascendente, comprometendo membros, tronco, musculatura facial e orofaringe (LAMÔNICA et al, LOPES 2009).
No Setor de Fonoaudiologia, durante a avaliação foi observado: fraqueza muscular, hipotonia e mobilidade reduzida de COF (Complexo Orofacial), hipersensibilidade intra-oral, hiposensibilidade extra-oral e parestesia facial à direita, alimentava por sonda nasogástrica, passando a alimentar por via oral na consistência de sólido umidificado. Foi proposto no Planejamento Terapêutico com a paciente Regulação Orofacial, exercícios miofuncionais ativos, estimulação sensório-motora extra e intra-oral, crioterapia. A mesma apresentou grande evolução em seu tratamento, hoje alimenta em todas as consistências por via oral, pode-se perceber ganho de força muscular melhora de funcionalidade de COF e normalização das sensibilidades. Continua em atendimento fonoaudiológico na instituição com o objetivo de otimizar mobilidade e tonicidade de língua.
4.2. PSICOLOGIA
O suporte psicológico a esses pacientes é muito importante devido a gravidade que essa doença traz consigo, por sua severidade de sintomas, uma gama de sentimentos e emoções que o paciente muitas vezes tem dificuldades de lidar. Desenvolve angústia e medo pela evolução da doença, impotência diante da dependência e acometimento que a síndrome traz, sentimentos de menos valia e ansiedade pela expectativa de melhora. Porém, a paciente deste estudo aceitou a doença com entusiasmo e não duvidou em nenhum momento de sua melhora. Buscou forças no apoio que a família e os amigos deram. Lutou veementemente contra todos os sintomas e seguiu à risca as orientações do tratamento para hoje ter orgulho de sua evolução. Sente-se agradecida por poder olhar a vida com outros olhos depois de tudo o que passou. Dá aula de força de vontade e persistência. Não reclama de nada e quer muito viver cada dia melhor.
Otaíres já consegue se locomover sem a cadeira de rodas e já retoma gradualmente as atividades da vida diária. Reestabeleceu sua autonomia para as tarefas domésticas e fala com muito orgulho de como as relações familiares com o filho e marido foram fortalecidas pela doença. A doença não trouxe somente perdas, mas também ganhos incalculáveis para sua saúde mental, emocional e espiritual.
Para o futuro faz planos de levar conhecimento para as pessoas sobre o que é a Síndrome de Guillan-Barré, pois sofreu muito pela falta de informação da doença. Quer conscientizar os familiares das pessoas acometidas por essa doença, as quais se encontram hospitalizadas, de que há esperança, de que há melhora, de que é tudo uma questão de luta e perseverança.
Essa paciente não foi atendida para tratamento no setor de psicologia dessa unidade. Não necessitou de reabilitação cognitiva, pois a consciência sempre esteve preservada. Contudo, foi necessária uma coleta de dados para a elaboração desse artigo que aconteceu apenas numa sessão. Aliás, momento ímpar e extremamente gratificante sentir nas palavras dessa paciente a força e a gama de possibilidades que um ser humano é capaz de ter, e, ainda, contagiar quem está na sua presença e convivência.
4.3. FISIOTERAPIA
Partindo dessas afirmações, propusemos uma atenção fisioterapêutica ao sujeito portador de Síndrome de Guillain-Barré, baseado no modelo assistencial de saúde vigente no Brasil (SUS) que contempla a assistência integral à saúde e a unificação das ações curativas e preventivas (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2009).
Para Stokes (2000), a recuperação é completa em 80 a 85% dos casos e ocorre em um período de até dois anos; 10% permanecem com incapacidade residual grave e cerca de 5% não sobrevive.
Também refere Rowland et al (2002) que a intervenção fisioterapêutica para o paciente portador de SGB visa acelerar o processo de recuperação, maximizando as funções, a fim de reduzir complicações de déficits neurológicos residuais. Dessa forma, a reabilitação fisioterapêutica teve como principal objetivo o restabelecimento da força muscular necessária para a minimização de suas incapacidades e para o retorno de suas atividades.
Ao chegar no setor de fisioterapia, paciente dependente, cadeirante, apresentava diminuição de força muscular: fraqueza de tronco, membros superiores e inferiores. Conduta inicial: alongamentos globais, fortalecimento de paravertebrais, abdominais, mudanças de decúbitos e transferências. Após adquirir essas posturas, paciente foi submetida a fortalecimento muscular com carga, utilizando: caneleiras, bolas, halteres, faixas elásticas, treino de equilíbrio, treino de marcha. Atualmente paciente executa exercícios para melhora da função: subir e descer escada e rampa, esteira e bicicleta ergométricas, agachamento, treino de marcha com obstáculo, treino de sentar e levantar, posturas de ajoelhado pra semi-ajoelhado. Em membros superiores eletroestimulação com FES, objetivando ganho de força e preensão palmar.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A paciente Otaíres Luz e Silva, continua em tratamento nesta unidade. Atualmente, consegue deambular sem auxílio, adquiriu ganho de força em membros superiores e inferiores e ADM, já tem autonomia para executar atividades de vida diária, recuperou sua coordenação motora fina para a escrita, sendo capaz de assinar seu nome. Vem tendo uma boa resposta no tratamento fisioterapêutico e fonoaudiológico.
Ainda precisa adquirir apreensão palmar completa, melhorar a marcha e a força muscular. No aspecto fonoaudiológico nessecita otimizar mobilidade e tonicidade de língua.
Estudos demonstram que a expectativa de melhora de uma pessoa acometida pela Síndrome de Guillain Barré é grande. O tratamento de reabilitação física é relevante em 40% dos casos de SGB, a ação da equipe interdisciplinar é essencial visando minimizar as sequelas e promover a independência e autonomia dos pacientes. O que falta hoje é informação sobre a doença, faz-se necessária maior divulgação dos sintomas e do tratamento para que cresça a consciência da população.
Antes:
Depois:
REFERENCIAS:
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Síndrome de Guillain-Barré. Portaria SAS/MS no 497, de 23 de dezembro de 2009.
CARVALHO TGML, LOPES RC. A integralidade na atenção fisioterapêutica no paciente portador da Síndrome de GuillainBarre. BIOMOTRIZ ISSN: 2317-3467 – vol7, n.2. Dez. 2013.
Lamônica DAC, Pereira TC, Silva KR, Lopes AC. Relato de caso: síndrome de Guillain-Barré – atraso do desenvolvimento da linguagem. Rev Med (São Paulo). 2009 jul.-dez.;88(3/4):199- 202.
MORAES, A. et al. Caracterização dos Pacientes com Síndrome de Guillain – Barré Internados em um Hospital Universitário. Revista Enfermagem Conteporânia. 2015 Jan./Jun.;4 (1):7-11.
O’SULLIVAN, S. B. & SCHMITZ, T. J. Fisioterapia – Avaliação e Tratamento. São Paulo: Manole, 2004. Dentro do artigo: BIOMOTRIZ ISSN: 2317-3467 – vol7, n.2. Dez. 2013.
ROWLAND L. P. M. Tratado de neurologia. 9ª Edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997. pág. 518-520.
STOKES, M. Neurologia para fisioterapeutas. São Paulo: Editorial Premier, 2000. pág. 201-210.
TUACEK TA, TSUKIMOTO GR, FIGLIOLIA CS, CARDOSO MCC, TSUKIMOTO DR, ROSA CDP, et al. Neuropatias – Síndrome de Guillain-Barré: reabilitação. Acta Fisiatr. 2013;20(2):89-95.
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